sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Se persistirem os sintomas, consulte um psicanalista
FANI HISGAIL
ESPECIAL PARA A FOLHA


Numa sociedade em que o cidadão é monitorado por "olhos eletrônicos", faróis inteligentes, câmeras digitais, numa constante sensação de paranóia implícita, o resultado não pode ser dos melhores.

Quando a vida pessoal se transforma num inferno particular, o mal-estar crônico adquire novas formas sintomáticas e a ansiedade toma conta.

Neste momento, o que se recomenda é procurar ajuda profissional. Se for um médico ou psiquiatra, a terapia medicamentosa estará ao alcance das mãos, mas se a opção fosse um psicanalista, a terapia baseada na palavra faria o sujeito falar do seu sofrimento.

A prática clínica consiste em fazer o paciente contar sobre quem ele pensa que é e como ele se apresenta para si e para quem o escuta. Como enfatizava Jacques Lacan, o analista age menos pelo que diz e faz do que por aquilo que é.

Significa que este exerce essa função somente quando houver alguém que lhe demande neste lugar. Entre quatro paredes e um divã, o analista se pergunta: O que ele quer de mim? A cura ou o apego ao sintoma? Quem ele pensa que sou, quando diz isso?

Em outras palavras, o analista funciona como arrimo das representações inconscientes com as quais o paciente dialoga e lida sem saber ao certo que isso acontece na transferência. A associação livre, regra fundamental do tratamento, opera mudanças quando o discurso faz um novo sentido, redefinindo o modo de escutar a própria história.

Quem não deseja falar de si para alguém? Ainda mais, quando as relações são vividas como superficiais, passageiras e vazias. Na era da comunicação móvel, o diálogo não é mais dialógico, é atravessado pelas lentes das tecnologias digitais criando uma profusão de sentidos díspares.

Para os mais jovens, as novas mídias e as redes sociais digitais (facebook, twitter, blogs) são fatos consumados: por meio destas tecnologias que a vida rola solta.

Alguns analistas acompanham a tendência e postam páginas no facebook, enquanto outros são seguidos no twitter ou nos blogs inteligentes e criativos sobre temas do cotidiano.

Estes eventos demonstram que a sociabilidade em rede, onde o virtual e o real são vivenciados como sendo a mesma coisa, chegou para ficar e apresenta dinâmicas nunca antes cogitadas, enquanto a energia se sustentar, pois na falta dá-se o caos.

Algumas situações que ocorrem hoje em sessões de análise confirmam como a cultura digital faz parte da produção do inconsciente.

Os analisantes se valem do torpedo para mandar mensagens ao psicanalista como: "estou a caminho", "desculpe, mas não poderei ir", "podemos mudar a sessão?" ou, quando não desligam o celular e dizem: "desculpe, mas preciso atender" ou "vou desligar o aparelho".

Outro fenômeno interessante é quando o paciente, para ser o mais fiel em seu discurso, lê o que o outro lhe escreveu no celular.

Sob esta perspectiva, as linguagens apresentadas sob os diferentes suportes - tablets, smartphones, laptops - compõem um aspecto da transferência de saber que a psicanálise atual deve conhecer e manejar.
Segundo a semioticista Lucia Santaella, "estamos vivendo a transição entre um modelo de acesso restrito à informação para um modelo aberto e livre, no qual a informação se espalha por todas as superfícies e ambientes".

Com essa constatação, fica-se mais exposto ao meio; porém, isto poderia prejudicar as análises? Ou, quanto mais o psicanalista parecer como um de nós, menor seria a idealização que gira em torno dele?
No passado, havia uma idéia de que o paciente não podia ter acesso à vida privada do analista, ao ponto de se produzir enormes resistências ao tratamento, se algo fosse revelado da sua intimidade.

O constrangimento maior era encontrá-lo em ambientes comuns e não saber o que fazer: cumprimentar, ignorar ou se esconder. Naquelas épocas, as análises eram restritas apenas à elite que podia pagar por elas, e os profissionais, todos de formação médica.

Tudo isso mudou! Hoje, os psicanalistas são psicólogos em grande maioria, e a psicanálise tornou-se conhecida e mais acessível. Desperta curiosidade, desejo de conhecer e experimentar; é assunto freqüente, tanto na mídia, quanto nas pesquisas acadêmicas.

Em público, diversos analistas emitem opiniões, participam de entrevistas e debates sobre temas da própria práxis.

Apesar de tantas informações, as pessoas têm dificuldade de diferenciar psicoterapeuta, psicólogo, psicanalista e psiquiatra, ainda que se tenha confiança de serem profissionais que cuidam da "cabeça", da "mente", do "subconsciente", do "psicológico" e do "comportamento".

As pessoas chegam aos consultórios com pesquisas feitas no Google sobre o remédio que estão tomando ou sobre o sintoma favorito, resultando em informações fragmentadas sobre a matéria. Não são poucas as medicadas indiscriminadamente; mais por médicos generalistas do que por psiquiatras.

Com notável sucesso de vendas e com o aumento de usuários das "tarjas prestas", o perfil do consumidor interessou as agências de publicidade, com os remédios apresentados na propaganda como produtos de primeira necessidade.

Não é para menos, quem ficou dependente de ansiolíticos e/ou antidepressivos, para poder se livrar deles, precisa tomar outra pílula que anula o efeito da anterior, e assim por diante.

É preciso um coquetel de pílulas para um coquetel de sintomas, deixando como rastro o insone que erra nas noites mal dormidas. Quem já passou por isso se reconhece quando alguém diz, ao chegar ao trabalho: "Cara, não agüentei e tomei um Dramin, e agora não consigo parar em pé".

A ausência de sono que afeta tanta gente, seja esta breve ou prolongada, é de tirar do sério. Para muitos, o uso constante das gotas de Rivotríl é mais eficaz do que contar carneirinhos. Pois é: até para nanar, é preciso se dopar!

Localizado no sono REM, o sonho é suprimido pela ação da droga, e não há nada menos salutar do que deixar de sonhar, sem lembrar nada para contar. Perde-se uma parte de si, um detalhe do mundo anímico que faz coro com o autoconhecimento e a dimensão subjetiva do desejo.

O inconsciente, patrimônio freudiano, nada tem a ver com o sistema nervoso central ou periférico. Mas, quando não podemos evitar que algumas fórmulas de compromisso caduquem com o passar do tempo, inviabilizando a felicidade e a tranqüilidade, talvez seja o momento exato para começar uma análise.

Os seres humanos são complicados, melhor dizendo, complexos. Soltos no mundo, desde crianças, temos de responder, como adultos, aos desafios da vida, antes reais do que virtuais. E o fato de sermos falantes, sexuados e mortais, isso não tem remédio. Independente dos meios eletrônicos, a cura pela palavra mantém seu prestígio, com mais de um século de sucesso em cartaz.

FANI HISGAIL é psicanalista e doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC/SP e autora do livro "Pedofilia, Um Estudo Psicanalítico" (Ed. Iluminuras, 2007); hisgail@uol.com.br

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Ciclo de Leituras Psicanalíticas



CICLO DE LEITURAS PSICANALÍTICAS
Livraria Cortez - Rua Bartira, 317 - Perdizes         

Desde meados da década de setenta, o ensino de Jacques Lacan tem fertilizado a prática analítica ao longo do mundo, recuperando & elucidando a teoria de Sigmund Freud. Na cidade de São Paulo, a produção dos autores locais muito contribuiu para a disseminação do legado conceitual que fundamenta a clínica.
          Numa iniciativa conjunta, a Livraria Cortez & a Editora Iluminuras promovem, a partir de agosto de 2011, o Ciclo de Leituras Psicanalíticas, coordenado por Oscar Cesarotto, com a finalidade de difundir as novas edições dos livros que norteiam a formação & o estudo sistemático. A atualização dos textos, sua história & contexto, articula a tradição com a transmissão, dando continuidade ao discurso analítico.
          A programação mensal destaca a interpretação dos psicanalistas interlocutores das obras comentadas.

Quarta feira, 10 de AGOSTO, 19:30-21:30h
-Jacques Lacan – Uma biografia intelectual, de Márcio Peter de Souza Leite & Oscar Cesarotto.
Mais do que uma narrativa anedótica, este livro acompanha a saga psicanalítica de Lacan, na construção do seu sistema de pensamento. Em destaque, as coordenadas teóricas dos seus escritos & seminários, junto com a lista cronológica de suas obras.
Apresentado por GERALDINO ALVES FERREIRA NETTO
Psicanalista. Coordenador do Curso de Pós-Graduação Lato Senso (CLASI – Campinas). Autor de Wim Wenders, Psicanálise & Cinema (Editora Unimarco, 2001) & Doze lições sobre Freud & Lacan (Editora Pontes, 2010).


Quarta feira, 14 de SETEMBRO, 19:30-21:30h
-Ideias de Lacan, organizado por Oscar Cesarotto.
          Participaram, neste volume, vinte & um psicanalistas & um poeta, reunidos numa associação livre, dedicados a explicar, parafrasear & formalizar os ditados, axiomas & aforismos lacanianos, desbravando o barroquismo dos textos & superando o hermetismo da significação.
Apresentado por OSCAR CESAROTTO
Psicanalista. Coordenador do curso de especialização em Semiótica Psicanalítica – Clínica da Cultura (COGEAE-PUC). Organizador de Ideias de Lacan (1995, 2001, 2010). Autor de Jacques Lacan – Uma biografia intelectual (com Márcio Peter de Souza Leite; 1993, 2001, 2010); No olho do Outro (1987, 1996); Um affair freudiano (1989); Contra natura (1999); Tango malandro (2003); O verão da lata ( 2006); Sedições (2008), todos pela Editora Iluminuras.

Quarta feira, 05 de OUTUBRO, 19:30-21:30h
-Doze lições sobre Freud & Lacan, de Geraldino Alves Ferreira Netto.
          Desde os primórdios do seu ensino, Lacan definiu o sentido do retorno a Freud como o retorno ao sentido de Freud, distorcido por décadas. A coerência doutrinária entre ambos é a referência da prática psicanalítica atual.
Apresentado por FANI HISGAIL
Psicanalista. Doutora em Comunicação & Semiótica. Organizadora de 14 conferências sobre Jacques Lacan (Editora Escuta, 1988) & A ciência dos sonhos (Editora Unimarco, 2000). Autora de Pedofilia – Um estudo psicanalítico (Editora Iluminuras, 2007).

Quarta feira, 16 de NOVEMBRO, 19:30-21:30h
-Psicanálise lacaniana, de Márcio Peter de Souza Leite.
          Com a exposição detalhada do campo freudiano, seus operadores de leitura & matemas, o teor magistral deste livro testemunha a importância do lugar ímpar que seu autor ocupa na história da psicanálise de orientação lacaniana no Brasil.
Apresentado por MAURO MENDES DIAS
Psicanalista. Membro fundador da Escola de Psicanálise de Campinas. Autor de Moda: Divina decadência (Editora Hacker, 2001) & Por causa do pior (com Dominique Fingermann; Editora Iluminuras, 2005)

Café Lacaniano



CAFÉ LACANIANO  
LIVRARIA da VILA
Rua Fradique Coutinho, 915
Vila Madalena

AGOSTO 13 – ARTE & INCONSCIENTE
Olívio Guedes & Oscar Cesarotto
                                                                                              
SETEMBRO 17 – O SEXO MASCULINO
Daniel Migliani Vittorello & Paul Kardous

OUTUBRO 15 – A AGRESSIVIDADE EM PSICANÁLISE
Mauro Mendes Dias & Eduardo Furtado Leite
                                                          
NOVEMBRO 26 OBJETO DE DESEJO, OBJETO DE CONSUMO
Pedro Luiz Ribeiro de Santi & Christian Ingo Dunker       

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CAFÉ LACANIANO – AGOSTO
Sábado, 13 de agosto, 11-13h
ARTE & INCONSCIENTE
Olívio Guedes & Oscar Cesarotto
            Um século atrás, Freud escrevia: “A psicanálise tem conseguido também esclarecer satisfatoriamente alguns dos problemas relativos à arte e aos artistas. Outros lhe escapam por completo.” Para Heidegger, o artista era “a origem da obra, e esta, a origem do artista.” Contudo, enquanto a produção surge no campo do Outro, consagrada como laço social, a condição do ato criativo permanece enigmática até para o próprio autor. Moral da História da Arte: “O inconsciente é o berçário das Musas.”
            O debate contará com a presença de Olívio Guedes, diretor cultural do MUBE & Oscar Cesarotto, psicanalista, autor de vários livros.
           
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CAFÉ LACANIANO – SETEMBRO
Sábado, 17 de setembro, 11-13h
O SEXO MASCULINO
Daniel Vitorello Migliani & Paul Kardous
            Desde a ovelha Dolly, os sexos deixaram de se diferenciar por sua função reprodutiva, pouco importando quem é homem ou mulher, quem dispõe de periférico e quem inveja.  Agora, com a oferta de intervenções cirúrgicas, hormônios & silicones, Natura já não segura nenhuma parada dura. E o outrora sexo forte, paradigma da Humanidade, é o mais frágil perante o mal-estar na cultura contemporânea.  No entanto, ser homem é desejar no paraíso; para isso, a única libido -a masculina, segundo Freud- continuará sendo a bússola da sexualidade, para todos os gostos.
            O debate contará com a presença de Daniel Migliani Vitorello, psicanalista, autor de Mantenha distância – O imaginário obsessivo de Nelson Rodrigues (Annablume) & Paul Kardous, psicanalista, autor de Impotência sexual – O Real, o Simbólico & o Imaginário (Casa do Psicólogo).             

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CAFÉ LACANIANO – OUTUBRO
Sábado, 15 de outubro, 11-13h
A AGRESSIVIDADE EM PSICANÁLISE
Mauro Mendes Dias & Eduardo Furtado Leite
            Para Lacan, a agressividade seria a tendência subjetiva correlata do modo de identificação imaginária, que determina a estrutura formal do eu na sua relação com seus semelhantes. Para Freud, o narcisismo das pequenas diferenças divide o mundo entre “nós” e “eles”: aos amigos, tudo; aos inimigos, lenha! A violência, parteira da História, define a condição humana, mas não necessariamente a nossa essência, que também comporta o amor & a paz, como pulsões sublimadas.
            O debate contará com a presença de Mauro Mendes Dias, psicanalista, autor de Moda & Psicanálise (Iluminuras) & Eduardo Furtado Leite, psicanalista, autor de Drogas, Concepções, Imagens (Annablume).

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CAFÉ LACANIANO – NOVEMBRO
Sábado, 26 de novembro, 11-13h
OBJETO DE DESEJO, OBJETO DE CONSUMO
Pedro Luis Ribeiro de Santi & Christian Ingo Dunker
            O capitalismo oferece satisfação garantida, mas nunca o nosso dinheiro de volta. A compra de qualquer mercadoria reduz a causa do desejo ao prosaico valor de uso, mas o gozo da posse talvez não possa trazer a felicidade augurada pela publicidade, o sedutor discurso do Outro, sempre superior ao produto. Se, como dizia Lacan, citando Spinoza, “o desejo é a essência do homem”, então, a sociedade de consumo promete o que nem a natureza dá, isto é, o maravilhoso mundo das compras & a propaganda enganosa.
            O debate contará com a presença de Pedro Luis Ribeiro de Santi, psicanalista, autor de Desejo e adição nas relações de consumo (Zagodoni Editora) & Christian Ingo Dunker, psicanalista, autor de O cálculo neurótico do gozo (Escuta).